O Encaixe das Coisas
Tudo começa com uma pedra, ou uma folha, rasto de sinal de trânsito no asfalto, pote de iogurte pousado numa prateleira do supermercado, amontoado de pedras que sugerem alguma figura intermitente, uma frase ou pensamento ouvido num podcast, o arranjo irregular das cadeiras em torno de uma mesa de jantar, o distorcer de qualquer coisa — seja de metal ou orgânica — nasce a partir de tudo. Onde qualquer coisa ganha matéria e cabe a mim configurar de modo que encaixe na ideia que procuro transmitir.




A configuração obedece a um exercício interior que dispensa pausas; é algo irrequieto. Ou seja, se inicio um determinado projecto, devo terminá-lo no mesmo instante. E se uma ideia me surge a meio da noite ou durante um jantar, devo precipitar o tempo o máximo que possível e agarrar no computador para materializar a ideia de imediato.
O uso da malha quadriculada auxilia-me a dar precisão às ideias. É o encaixe das peças, a dimensão racional e técnica das "coisas". É um exercício metafísico e racional que, por vezes, obedece a estímulos aleatórios — que, no fundo, não são propriamente aleatórios. Acredito que os objectos, as coisas que nos rodeiam, são ricos de mensagens, volumes e formas que podem traduzir-se e encaixar em diversos temas. É daí que nascem as minhas colagens digitais: do exterior, aparentemente invisível e vazio.
Busco "libertar" diversos temas que perturbam a sociedade — desde a política, música, religião, ao consumismo doentio — e como o Homem tem sofrido transformações na sua interacção com o outro.
As cores vibrantes e os tons negros e cinzentos reflectem a sobriedade e a contundência que tendem a roubar a atenção de quem os observa. E isto também reflecte o nu, que seria imperceptível se mantivesse a sua cor original. O nu provoca, inquieta, mexe com a nossa intimidade — e é esta intimidade invasiva à nossa visão que procuro provocar: discussão, reflexão e o despertar de modelos de opinião diferenciados.
Não procuro, de forma objectiva, expor a minha opinião sobre os temas que proponho, mas sim extrair de quem observa, opiniões. Fazer com que o telespectador seja parte integrante do cartaz. Daí que, em alguns cartazes, possam existir diversas opiniões e percepções sobre o mesmo. É natural — a intimidade é única para cada um — mas, ao final do dia, cabem na mesma peça: O ENCAIXE.
Autor: Eduardo Mzauanga - Designer de Comunicação